A inflação medida pelo CPI (Índice de Preços ao Consumidor, na sigla em inglês) nos Estados Unidos subiu para 3,5% em março, acima das expectativas do mercado, e reduziu ainda mais as expectativas sobre o início do ciclo de corte de juros no país. Economistas consultados pela Bloomberg projetavam alta de 3,4%.
O resultado de março representou o segundo mês seguido de aceleração da inflação nos EUA. Em fevereiro, o CPI havia acelerado para 3,2%, ante 3,1% no mês anterior. Os custos da gasolina e da moradia, que incluem aluguéis, representaram mais da metade do aumento.
O chamado "núcleo" do índice, que exclui preços de energia e alimentação, também preocupou: foi para 3,8%, mesmo nível de fevereiro e acima das projeções de 3,7%.
A leitura do núcleo da inflação de março representa uma aceleração maior que todos os resultados entre julho de 1992 e abril de 2021, antes do pico inflacionário da pandemia de Covid-19.
Após a divulgação, os rendimentos dos títulos do Tesouro americano dispararam e desencadearam uma valorização global do dólar. O índice DXY, que mede o desempenho da moeda ante outras divisas fortes, teve alta de quase 1%. No Brasil, o dólar subiu 1,43%, renovando seu maior patamar do ano cotado a R$ 5,077.
A renda variável também foi penalizada. O Ibovespa encerrou o pregão com recuo de 1,41%, aos 128.053 pontos, e os índices americanos S&P 500, Dow Jones e Nasdaq recuaram 0,95%, 1,09% e 0,84%, respectivamente.
Os novos números evidenciaram que a inflação americana segue persistente e puseram mais um obstáculo para o Fed (Federal Reserve, o banco central americano) iniciar o tão aguardado ciclo de afrouxamento monetário. A meta de inflação da autoridade monetária é de 2%.
Logo após o anúncio do CPI de março, o presidente dos EUA, Joe Biden, afirmou que ainda "há mais a fazer" para aliviar a alta de preços no país. O ex-secretário do Tesouro americano Lawrence Summers afirmou em entrevista a Bloomberg que os números trazem mais chances de um possível aumento nos juros.
Se antes as apostas eram de que o primeiro corte nas taxas americanas ocorreria em junho, agora as projeções foram adiadas para o segundo semestre. Segundo a ferramenta FedWatch, do CME Group, a maioria dos operadores passou a prever que o primeiro corte de juros só deve ocorrer em setembro.
Além disso, o mercado agora prevê apenas mais um corte até o final do ano. A última sinalização do Fed havia sido de três cortes, e as projeções mais otimistas chegaram a projetar até seis reduções.
"A inflação dá sinais de estar se estabilizando em um patamar elevado, mesmo com juros no maior nível dos últimos 20 anos. Esse cenário não é condizente com o início do ciclo de cortes de juros no primeiro semestre", afirma Felipe Salles, economista-chefe do C6 Bank.
O banco projeta que devem ocorrer apenas dois cortes nos juros americanos neste ano, ambos no segundo semestre. A hipótese de que o afrouxamento monetário não ocorra neste ano não está descartada.
Analistas do Itaú BBA também destacaram que a composição do índice foi ruim, com aceleração dos serviços para níveis próximos aos picos do ciclo de aperto monetário, e reduz as chances de cortes de juros pelo Fed.
O dado de inflação somou-se a dados fortes de emprego divulgados na última sexta (5), que já haviam aumentado o pessimismo do mercado sobre o futuro da política de juros americana.
As últimas sinalizações de diretores do Fed foram de cautela. As autoridades repetiram o discurso de que não há pressa para iniciar o afrouxamento de juros e que devem aguardar novos dados para tomar a decisão. O próprio Jerome Powell, presidente da instituição, admitiu que a batalha contra a inflação não está garantida.
"É provável que em maio o Fed comece a preparar terreno para possíveis cortes, mas que essa reunião não siga o padrão previsível das anteriores e se torne mais complexa. Essa incerteza tende a impactar os ativos brasileiros como um todo, pressionando o câmbio e valorizando o dólar, o que pode resultar na redução do fluxo estrangeiro para a Bolsa", diz Gustavo Cruz, estrategista-chefe da RB Investimentos.
O investimento estrangeiro na Bolsa brasileira, aliás, vem diminuindo neste ano. No primeiro trimestre, os investidores de fora do país retiraram mais de R$ 20 bilhões, justamente por conta do adiamento das apostas sobre juros nos Estados Unidos.
Com a divulgação dos dados, o Ibovespa começou o dia em queda, assim como os índices americanos.
No fim do ano passado, uma onda de otimismo levou os mercados globais a níveis recordes, apoiada no crescimento das apostas de que os juros americanos poderiam começar a cair já em março deste ano. Agora, investidores devolvem os ganhos.