A volta de Marta Suplicy ao PT foi, como todas as movimentações políticas da ex-prefeita nos últimos anos, uma decisão tomada em conjunto com seu marido e principal conselheiro político, o empresário Márcio Toledo.
Articulador da ex-prefeita, Toledo estava com ela e o presidente Lula (PT) na foto do encontro em que Marta disse sim ao convite para retornar à sigla e ser vice de Guilherme Boulos (PSOL) na corrida à prefeitura. Ele também a acompanhou na reunião para a demissão dela do cargo de secretária de Relações Internacionais da gestão Ricardo Nunes (MDB), principal rival de Boulos na eleição.
Toledo, 63, e Marta, 78, começaram a namorar em 2009 e se casaram em 2013. Ex-presidente do Jockey Club de São Paulo e desde a juventude ligado à política, o empresário logo se tornou a figura que, nos bastidores, ajuda a tornar realidade as aspirações da esposa.
Relatos colhidos pela reportagem com aliados, adversários e pessoas do entorno, a maioria falando sob a condição de anonimato, descrevem Toledo como um negociador habilidoso, cordial e sagaz. A impressão geral é a de que os rumos da ex-prefeita são fruto de decisões compartilhadas entre os dois —mas que a palavra final é dela. Procurados, eles não deram entrevistas.
"Qualquer especulação sobre tutela ou dependência é fruto do machismo estrutural que envergonha a nossa sociedade", diz o advogado petista Marco Aurélio de Carvalho, amigo íntimo do casal. Marta já considerou a possibilidade de ser vice do advogado numa campanha à prefeitura.
"Ela é uma figura forte, com liderança, luz própria e legado. É natural que confie no marido, alguém com uma visão sofisticada e que vive a política tanto quanto ela", segue o coordenador do grupo Prerrogativas.
Toledo fez a ponte entre Marta e interlocutores em todas as campanhas desde 2010, num papel de operador político, arrecadador de recursos e consultor em questões de estratégia e comunicação.
Desta vez, participou de todas as etapas da reviravolta que levou à saída de Marta da prefeitura para retornar ao PT —superando mágoas de parte a parte, como a causada pelo voto da então senadora pelo MDB no impeachment de Dilma Rousseff (PT).
Toledo estava presente, por exemplo, em conversas da ex-prefeita com o deputado federal Rui Falcão (PT-SP), incumbido por Lula de acertar a volta dela ao partido para uma dobradinha com Boulos, ideia antecipada pela Folha de S. Paulo em novembro. No último dia 13, Marta e o marido receberam Falcão e Boulos com as respectivas esposas para um almoço no apartamento deles, nos Jardins, região nobre da capital.
Toledo é considerado um anfitrião invejável, do tipo que serve boa comida e bebida. Ele promove encontros para discussões informais, em casa e no escritório, com políticos de diferentes campos. A formação da chapa Lula-Geraldo Alckmin e o apoio de Simone Tebet (MDB) ao petista passaram por sua sala de jantar.
Sempre circunscrito ao campo da centro-esquerda, construiu como marcas o ecumenismo e a defesa de frentes amplas, seguindo uma linha pragmática sob o argumento de preservação da democracia.
A discrição e o jeito polido podem às vezes dar lugar a um estilo mais duro, segundo um amigo que elogia o tom incisivo do empresário para defender suas posições. Interferências de Toledo em campanhas de Marta já provocaram rusgas com partidos, como noticiou a Folha de S. Paulo em 2010 e em 2016.
Uma ex-dirigente partidária que negociou com o casal na época da eleição de 2020 diz que os dois se complementam, cabendo ao marido abrir conversas, esperar respostas e guiar a parte prática.
Naquele pleito, a ex-prefeita flertou com uma candidatura à prefeitura e entrou no Solidariedade. Na reta final, se desfiliou e decidiu apoiar Bruno Covas (PSDB), que venceu Boulos e levou Marta para o governo.
Uma cena daquela campanha ilustra o que amigos veem como carinho e companheirismo de Toledo em relação a ela. Em meio à pandemia de Covid, na espécie de papamóvel construído para a ex-prefeita percorrer a cidade, ela acenava animada em pé —e o marido ia sentado ao lado.
Principal dirigente do Solidariedade, o deputado federal Paulinho da Força (SP), diz que se distanciou de Marta e Toledo após a saída dela da sigla. "Eles fizeram um acordo, nas costas do partido, com o Bruno Covas. Na verdade, nos traíram ali", afirma à reportagem.
"Eu não quero mais ter nenhuma relação nem com ele nem com a Marta", continua. "Essa passagem da Marta pelo Solidariedade foi muito ruim para nós, é um episódio que é bom esquecer."
O rompimento com Nunes também foi traumático, como atesta o aborrecimento do prefeito pelo fato de Marta ter negociado com o PT enquanto ainda tinha cargo na prefeitura. Nas palavras de um agente político próximo do empresário, a articulação da vez não teve a marca Márcio Toledo —teria faltado a elegância e a transparência adotadas em outros momentos.
Uma crítica de Toledo a Boulos na campanha de 2020, chamando-o de "picareta", passou a ser relembrada. Num grupo de WhatsApp, o empresário insinuou que o psolista fingiu ter Covid para faltar a um debate em que seria "trucidado e desmascarado".
Filho de um prefeito de Indaiatuba (SP) cassado pela ditadura militar, Toledo deve sua formação política à militância no Partido Comunista Brasileiro (PCB), o Partidão, à atuação na UNE (União Nacional dos Estudantes) e na juventude do MDB. Ele se desfiliou do partido somente em 2018, acompanhando Marta.
Formado em direito pela PUC e jornalismo pela USP, o empresário não priorizou a busca de cargos eletivos ou públicos, mas chegou a ser pré-candidato a prefeito pelo MDB em 2008 e cotado para vice em 2012.
A dedicação maior é à atividade empresarial —sua holding atua no ramo de telecomunicações e investe, entre outros setores, em energias renováveis.
Fontes ouvidas pela reportagem dizem que é uma ilação e má-fé supor que decisões políticas de Toledo tenham ligação com interesses econômicos, mas reconhecem que, como articulador ou empresário, ele mantém um círculo variado de interlocutores e trânsito privilegiado, o que qualquer homem de negócios almeja.
No fim de 2023, Toledo fundou a Associação Brasileira de Armazenamento de Energia (Armazene) e reuniu em um jantar o ex-governador João Doria (ex-PSDB), a pré-candidata Tabata Amaral (PSB), o ex-ministro Moreira Franco (MDB) e o deputado federal Arnaldo Jardim (Cidadania-SP), que preside o conselho consultivo da entidade.
O site da Armazene registra que Toledo e outros diretores viajaram a Brasília para um seminário do setor e foram recebidos em 27 de novembro no Palácio do Planalto pelo ministro petista Alexandre Padilha (Secretaria de Relações Institucionais). A agenda dele não registra esse encontro, e a pasta não comentou o assunto.
A reportagem apurou que Toledo também esteve com Marco Aurélio Ribeiro, conhecido como Marcola, chefe de gabinete de Lula —fato que, ao ser descoberto por Nunes, fez o prefeito perceber que a costura de Marta com o presidente estava perto de ser concluída.